A demora por parte do Ministério Público Federal (MPF) em oferecer denúncia contra os alvos da Operação Céu Dourado, deflagrada pela Polícia Federal outubro de 2019, levou a Justiça Federal de Goiás a restituir dois avisões, ambos do modelo Piper Aircraft PA-34 (bimotor), e liberar os bens que foram sequestrados do empresário Bruno César Cecchini e da empresa RJR Minas Export Eireli, situada em Goiânia. Na operação, foram cumpridos 24 mandados de busca e apreensão nos estados de Goiás, Mato Grosso e São Paulo, mediante suspeita de uma série de crimes envolvendo extração ilegal e contrabando de 1,5 tonelada de ouro extraido ilegalmente em garimpos clandestinos de Mato Grosso.
O juiz Alderico Rocha Santos, da 5ª Vara Federal Criminal da Justiça de Goiás, acolheu pedidos formulados pela defesa do empresário Bruno Cecchini e familiares investigados na operação. Conforme o advogado Valber Melo, responsável pela defesa do empresário, desde a apreensão de uma das aeronaves que transportava mais de 110 quilos de ouro, valores superiores a R$ 34 milhoes foram bloqueados no decorrer das investigações. A decisão do juiz federal desbloqueu todos os valores e bens.
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A decisão foi assinada pelo magistrado em maio de 2021. E, e de lá para cá, diversos recursos já foram interpostos pelo empresário e por diferentes empresas na Justiça Federal de Goiás e junto ao Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1). Houve, inclusive, decisões autorizando a restituição do ouro apreendido e também revogação de despachos para manter a apreensão do minério. Pedidos para liberação do ouro partiram das empresas CHM Brasil Metais, RJR Minas Export Eireli e BJR Agro Minas Ltda e também de Bruno César Cecchini.
O Ministério Público Federal deu parecer contrário aos pedidos dos investigados na Operação Céu Dourado e defendeu que fosse mantido inalterado o sequestro das aeronaves e dos valores bloqueados nas contas bancárias. No entanto, esse parecer não foi acolhido pelo juiz Alderico Rocha dos Santos.
"In casu, as aeronaves foram apreendidas em 10.06.2019 e 19.09.2019, ou seja, já são passados quase dois anos do cumprimento da diligência de sequestro, sendo que, até a presente data, não foi intentada a ação penal correspondente aos fatos ensejadores do sequestro. Pelo mesmo fundamento supra, o levantamento do sequestro das contas/valores deve ser deferido. Destarte, o levantamento do sequestro das mencionadas aeronaves e das contas/valores é medida que se impõe, por determinação legal", escreveu o juiz federal em trecho da decisão assinada em 14 de maio de 2021.
As duas aeronaves liberadas por ele são bimotores da fabricante Piper Aircraft, modelo PA-34-220T. Uma delas foi apreendida transportando 110 quilos de ouro no Aeroporto Santa Genoveva, em Goiânia, no dia 10 de junho de 2019. O minério apreendido estava acompanhado de 16 notas fiscais, nas quais figuravam como emissora a RJR Minas Export e como destinatária a RJR Minas Export Eireli.
Na decisão que liberou os aviões, o juiz federal uma foi apreendida em decorrência da lavratura do auto de prisão em flagrante dos ocupantes por supostos crimes definidos no artigo 2 º, da Lei 8.176/91 (usurpação de bem da União), e artigo 55, da Lei 9.605/98 (extração de ouro sem autorização legal). O segundo crime foi uma infração ambiental consistente na extração de minérios sem licença ambiental.
"Da análise das tipificações penais referidas supras, tem-se a certeza absoluta que a aeronave apreendida não é produto e nem instrumento do crime. O produto refere-se ao mineral extraído, já o instrumento consiste nas máquinas utilizadas para a extração. A aeronave apenas transportava o ouro, post factum não punível, pois consiste no exaurimento da conduta, ao teor da análise do iter criminis", escreveu o magistrado em trecho a sentença.
Em seguida, o juiz federal enfatizou que: "ainda que se tratasse de instrumento do crime, a liberação da aeronave é medida que se impõe, por força do disposto no artigo 91, II, alinea 'a’, do CP, o qual só permite o perdimento do instrumento do crime quando 'fabrico, alienação, uso, porte ou detenção constitua fato ilícito'. A aeronave trata-se de bem de fabrico, porte e uso permitido por lei, por isso lícitos. Assim, é de se concluir que a restituição da aeronave apreendida por ocasião do flagrante é medida que se impõe", decidiu o magistrado federal.
OURO APREENDIDO
Em relação à restituição do ouro apreendido, o juiz Alderico Rocha Santos ponderou que em tese, pode se constituir em produto do crime de usurpaççao be bem da união, por isso está sujeito a perdimento no caso de uma eventual condenação criminal. Nesse caso, conforme observado pelo magistrado, para que seja mantida a apreensão por longo tempo exige-se indícios da autoria e materialidade, requisitos para o oferecimento da denúncia.
"É verdade que as diligências investigativas ainda não se encerraram, o que poderá ensejar a oferta de denúncia futuramente. Porém, trata-se de expressivo valor apreendido, o que importará, por via de consequência, em elevado prejuízo, caso não se comprove a ilicitude da extração do mineral", observou o magistrado na sentença.
De acordo com o magistrado, as empresas apresentaram as notas fiscais do ouro apreendido, e até que seja provado o contrário, é de se considerar legítimas as notas, pois a boa-fé é presumida, enquanto a fraude necessita de provas.
"Ocorre que já são passados quase dois anos e ainda não foram produzidas provas suficientes a infirmar a presunção de licitude das notas fiscais, de forma que as mesmas devem ser consideradas. Por outro lado, ante a possibilidade de comprovação futuramente de origem ilícita do ouro, convém que a sua liberação seja condicionada a prestação de caução idônea (fiança bancária ou gravame sobre imóvel) em relação a 50% do valor do ouro apreendido. Isto posto, defiro o pedido de levantamento do sequestro das aeronaves, bem como das contas/valores", escreveu o juiz federal na sentença.
Nos autos, a empresa CHM do Brasil Metais afirma ser a legítima proprietária do carregamento de ouro apreendido, pois garante que comprou o minério da empresa RJR Minas Export. "Também defiro o pedido da empresa CHM do Brasil Metais Ltda de liberação do ouro apreendido, mediante caução idônea consistente em fiança bancária ou gravame sobre imóvel no importe de 50% do ouro apreendido. Ainda, a liberação do ouro fica condicionada ao pagamento dos tributos devidos à União, relativos à exploração do mineral", decidiu o magistrado.
INDICIAMENTO DE 15 PESSOAS
Em março deste ano a Polícia Federal indiciou 15 pessoas pelos crimes de organização criminosa, usurpação de bem da União, extração de ouro sem autorização legal, receptação qualificada, falsidade ideológica e lavagem de dinheiro. Um relatório assinado pelo delegado da PF, Bruno Pereira Pinto Gama, de Goiás, apontou que o grupo liderado pelo empresário Bruno Cézar Cecchini, vendeu e transportou ilegalmente 1.515 quilos de ouro (1,5 tonelada) que foram usurpados da União. Em valores, estima-se que foram movimentados cerca de R$ 450 milhões no suposto contrabando do minério.