A disputa eleitoral é algo importante. Necessária. Imprescindível, na verdade. Não por conta do bate-boca bastante frequente entre candidatos, apoiadores ou torcedores. Bate-boca é briga de rua, de esquina. Briga que não acrescenta em nada, nem para o eleitorado, tampouco para o processo democrático. Ainda que seja exatamente isso que se vê a cada dois anos, seja em eleições municipais ou nas gerais. Filme repetido, enredo desgastado, “script” velho. Mesmo que um ou dois dos responsáveis por esse triste espetáculo venham a dizer, e sempre dizem ser o “novo”, o “não político tradicional”, mas sim os que vivem para a política, com vistas ao interesse público e coletivo. Dizem isto com entonação, falseiam a voz, afinal, foram treinados. Mas, ao dizê-los, ainda que com gestos decorados e ensaiados, emitem tão somente o som da boca, não o da razão.
Razão que os desmascaram, pois, em nada, sequer, se parecem com o que afirmam ser. São, de verdade, iguais aos demais, até nos vícios, ainda que venham, e se esforçam bastante para se mostrarem diferentes. Estão longe de sê-los. O que requer do eleitor atenção desdobrada, senso crítico aguçado, mesmo que não seja amante das obras de Hitchcock, nas quais a oralidade diz uma coisa, aponta um sentido, mas a imagem diz outra muitíssimo diferente. Ilusionista é apenas um traço comum entre eles. Um segundo traço é o de falsear a realidade, supervalorizando seus feitos, embora nada tenham de importante para realça-los. Não sem razão, portanto, que se fala que o discurso político é, por excelência, o lugar do jogo de máscaras. Uma vez mais, requer do eleitorado que evite ser apenas votante, e torne-se cidadão, imbuído de criticidade, até para não comprar “gato por lebre”. Possibilidade existente, e não se pode ignorá-la, nem fingir-se que ela inexiste. Existe, e é verdadeiramente real. Isto leva à outra verdade, irrefutável, a de que a mentira sempre foi, e é a protagonista do jogo político-eleitoral.
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Alguns podem até argumentar, e, ao fazê-lo, agarram-se a tese da meias-verdades. Meias-verdades, contudo, são mentiras por inteiras. De novo, o cidadão é convocado para agir, para avaliar, muito embora, a todo instante, pode ser entretido pelas ondas ilusionistas do marketing. Não se tem dúvida que pode ser tentado, e será a todo instante levado, mas o seu papel, até como tal, e não mais na condição de simples votante, a refutar as fantasias, as frases ocas, os dizeres sem sentidos. Tarefa nada fácil. Até por conta do próprio jogo. Um jogo que se dá pela emoção. Os atores desse mesmo jogo, “novos” ou não, insistem em mantê-lo na esfera emocional, uma vez que é bem mais tranquilo seduzir seus alvos. Daí os ataques pessoais e o uso da palavra Deus, rotineiramente, bem como de algo que possa ligar o eleitor aos seus e a terra. O que quebra qualquer possibilidade para a reflexão.
O refletir, por outro lado, obriga o leitor a tomar para si o direito dele próprio se decidir, e, então, fica longe, bem longe de ser um alvo fácil. E, assim, percebe o que era, antes, impercebível, não notado. Soma-se a isso, claro, o fato de que ele valoriza o conhecer. Não qualquer conhecer. Conhece-se com os olhos da alma ou com os olhos da inteligência, no dizer de Sócrates. Olhos que recebem a luz do sol. Luz que agride o olhar, quando este se vê diante de seus raios, assim que o leitor escapa do fundo da caverna, e se transforma unicamente em cidadão. Mudança necessária, imprescindível, desacompanhada de quaisquer fantasias, inclusive as de que o mal está no candidato “A”, nunca no “B”, o corrupto é sempre o primeiro, jamais o segundo. Tem-se, aqui, a importância da disputa eleitoral. Importância para o eleitorado, o cidadão. É isto.
* LOUREMBERGUE ALVES é professor universitário e analista político.