Com o preço da gasolina, do gás natural (GNV) e do etanol em alta, a inflação para o motorista no Brasil disparou e já chega a 18,46% no acumulado em 12 meses até outubro, segundo um levantamento realizado pelo Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV). É a maior inflação para esse grupo desde 2000.
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Esse aumento passou a consumir boa parte do orçamento dos brasileiros nos últimos meses. A alta também provocou uma enxurrada de reclamações de motoristas de aplicativo, que viram a renda do trabalho diminuir – as principais empresas do setor até anunciaram um aumento no repasse no valor da corrida para os trabalhadores.
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Uma comparação com os índices que medem a inflação cheia para o consumidor reforça como a alta de preços tem sido mais expressiva para o motorista:
O Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) – calculado pelo IBGE – acumula alta de 10,25% até setembro
O Índice de Preços ao Consumidor (IPC) – apurado pela FGV – subiu 9,57% nos 12 meses até outubro.
Para calcular a 'inflação do motorista', o Ibre levou em conta uma série de itens, além da variação do combustível. No cálculo, estão preço do automóvel novo e usado, gasto com peças e acessórios, seguro, entre outros. Veja abaixo como ficou o índice:
"A gasolina, o GNV (Gás Natural Veicular) e o etanol têm sido o principal vilão", afirma Matheus Peçanha, pesquisador do Ibre a autor do levantamento.
"A gasolina e o GNV têm sido prejudicados pelo barril de petróleo, que tem subido de preço por causa da política da Opep, de reduzir a produção. E há o impacto do câmbio porque a Petrobras reajusta os seus preços com base nessas duas variáveis", acrescenta Peçanha.
Já o preço do etanol acumula uma alta expressiva por causa da crise climática, que prejudicou a produção de cana de açúcar.
O motorista sofre ainda com o desarranjo das cadeias de produção por causa da pandemia.
A combinação entre a interrupção das fábricas e a retomada econômica acelerada de boa parte dos países provocou uma escassez de chips no mundo todo e, consequentemente, de peças, o que fez com que várias montadoras fossem obrigadas a interromper a produção de automóveis.
Com esse descompasso, houve uma queda na oferta de veículos novos e, consequentemente, um aumento na procura por carros usados. O resultado foi uma alta de preços generalizada.
"Na esteira provocada pela falta de peças e não ter carro novo para vender, houve uma demanda maior por carro usado", diz Peçanha. "E essa demanda maior elevou o preço do carro usado. Toda essa conjuntura gerou uma inflação monstruosa ao motorista."
Nas ruas, perda de renda
Nas ruas, os brasileiros que trabalham como motoristas sentem na veia a alta da inflação e amargam grandes perdas na renda.
Desde 2016 trabalhando como taxista, Yago Costa, de 28 anos, diz que 50% do seu faturamento "fica na rua por causa de gastos com refeição e combustível".
Uma parte do que sobra vai para gastos relacionados ao trabalho, como seguro ou uma eventual manutenção do veículo. "Não está sobrando quase nada, para falar a verdade."
Com uma renda tão reduzida, Yago teve de cortar lazer e trocou a carne pelo frango.
"Hoje, sair é muito raro. Saímos uma vez no mês e olhe lá", diz o motorista, que mora com a esposa e um filho. "E mudamos até mesmo a alimentação: quando a carne está cara, você vai no frango. É assim que vamos tentando driblar a inflação e a crise."
A história de Valter Bernardo da Silva, 44 anos, segue o mesmo roteiro.
Ele é taxista há 16 anos e, com a queda na renda, passou a trabalhar com aplicativos para aumentar o seu ganho.
"A minha renda hoje é praticamente 50% do que ganhava há uns quatro anos", diz Valter. "Antes dos aplicativos era uma coisa; depois dos aplicativos é outra coisa. E, agora, com esse aumento sem controle dos combustíveis é, de novo, outra coisa."
Agora, Valter tenta equilibrar a renda trabalhando para aplicativos.
"As corridas de táxi diminuíram bastante e não adianta ficar reclamando, procurando culpado porque a situação do Brasil não é fácil", afirma. "O que eu preciso fazer é achar uma saída, uma solução para o meu problema. E é isso que tento fazer ao trabalhar com os demais aplicativos. Vou equilibrando a minha renda e consigo sobreviver, não como antigamente, mas consigo pagar as contas."
E o que esperar do futuro?
Na avaliação do pesquisador do Ibre, no ano que vem, o preço da gasolina deve seguir pressionado porque não indicativo de que a Opep decida aumentar a produção para dar conta da demanda, o que poderia levar a uma queda na cotação do barril do petróleo.
O preço dos combustíveis também pode ser pressionado por causa do câmbio. Em 2022, o Brasil vai eleger um novo presidente, e anos eleitorais costumam ser de bastante turbulência no mercado financeiro.
"Em 2022, a gente pode continuar com petróleo e câmbio pressionados, e aí a gasolina vai seguir cara”, afirma Peçanha. "Mas o problema climático, que estava impactando o etanol, já tem melhorado. Então, os preços da cana e, consequentemente, do etanol podem voltar para a normalidade."
Por fim, o economista ainda avalia que as cadeias de produção devem se normalizar, evitando uma nova alta no preço dos automóveis.
"A questão das peças parece que já foi solucionada. Os insumos para a produção de carro novo mais baratos podem trazer o preço do automóvel novo para a normalidade. E isso também pode sanar a demanda pelo automóvel usado", diz Peçanha.